domingo, maio 04, 2014

In memoriam: 65 anos depois

À hora em que esta singela nota está a ser escrita ainda falta pouco menos de duas para se cumprirem 65 anos sobre um dos mais trágicos momentos desportivos de todos os tempos.
A equipa italiana do Torino, denominada «Il grande Torino» pelos seus apoiantes, uma das mais fortes equipas da época, havia disputado poucas horas antes em Lisboa diante do Benfica, um jogo amigável de homenagem ao capitão da equipa encarnada, Francisco Ferreira, que se retiraria dos relvados. A poderosa equipa era tetra-campeã italiana e preparava-se para conquistar o 5º título.
O jogo amigável aconteceria na sequencia da amizade que se estabeleceu então durante o encontro Portugal-Itália, realizado três meses antes, entre os dois capitães de equipa: Francisco Ferreira e Valentino Mazzola, capitão da equipa italiana e também do Torino.
Por este facto e pelo facto do Torino ser uma grande equipa, surgiria o convite. O presidente do clube de Turim, Ferrucio Novo, resolveu confirmar o amigável para o dia 3 de Maio, em Lisboa. A partida seria ganha pelo Benfica por 4 a 3 diante de um público de 40 mil pessoas.
Depois da partida decorreu um jantar de confraternização estabelecendo-se entre os jogadores das duas equipas uma sincera amizade.
No dia seguinte, a tragédia. A aeronave Fiat G212, da Avio Linee Italiane, que transportava 31 passageiros entre tripulação, jogadores e funcionários do clube italiano e jornalistas, descolou às 9 horas e 52 minutos do Aeroporto da Portela em Lisboa e fez escala para reabastecimento em Barcelona às 13 horas e 15 minutos, conforme previsto. A descolagem do aeroporto de Barcelona deu-se pelas 14 horas e 50 minutos. Tudo corria como previsto e sem sobressaltos, porém ao aproximar-se do espaço aéreo italiano, a tripulação recebe informação meteorológica dando conta de denso nevoeiro que entretanto se formara, com visibilidade horizontal abaixo de 40 metros. Pelas 16 horas e 59 minutos, o comandante Pierluigi Meroni avisa a torre de controlo de Turim que está iniciando os procedimentos de aproximação visual para realizar a aterragem. Durante a manobra de aproximação, o comandante foi traído pela má visibilidade, a aeronave desceu perigosamente e às 17 horas e 05 minutos, embateu em cheio contra uma das torres da Basílica de Superga. Ninguém sobreviveu ao desastre.



 Imagem dos destroços do acidente de 4 de Maio de 1949 que vitimou todos os passageiros e em particular toda a equipa do Torino quando esta regressava de Portugal após um jogo amigável com o Benfica









 Emblema do Torino Futebol Clube aquando da tragédia



  Actual emblema do Torino FC



 Basílica de Superga


 A notícia da tragédia caiu como uma bomba, abalou profundamente a Itália e causou profunda consternação em todo o mundo e em especial em Portugal. De imediato, o Torino foi declarado campeão de Itália isto quando ainda faltavam quatro jornadas para o fim do campeonato. Cerca de 500 mil pessoas acompanharam o cortejo fúnebre da equipa, realizado no dia 6 de Maio. Gigantescas manifestações de pesar teriam lugar não apenas em Itália mas também em Lisboa onde milhares de pessoas se juntaram espontaneamente para expressar as suas condolências diante do edifício onde estava sedeada a Legação de Itália em Portugal.




Imagem dos funerais que decorreram no dia 6 de Maio de 1949


 Milhares de pessoas juntaram-se na manifestação de pesar diante do edifício da legação italiana em Lisboa






 Os ecos na imprensa italiana e portuguesa daquela que ficaria conhecida como a Tragédia de Superga


As ondes de choque da tragédia ecoaram e tocaram fundo também numa pequena vila, perdida no Alentejo a cerca de 120 Km da capital portuguesa: a vila do Torrão.
Os dirigentes do clube local, fundado dois anos antes, então chamado Torpedo Torranense, mudaram o nome da agremiação como forma de homenagem à malograda equipa, para Torino Torranense.

Emblema do Torino Torranense


O acidente abalaria profundamente o clube de Turim e acabaria com a base da selecção italiana. No mundial de 1950, disputado no Brasil, os italianos não passariam da primeira fase. O Torino entraria em declínio e só voltaria a ser campeão 27 anos depois, em 1976.
Sessenta e cinco anos depois, também o Torino Torranense é hoje uma triste sombra daquilo que foi isto apesar de em 2000 se ter construído um pavilhão que pouco ou nada tem servido e hoje se encontra em estado de semi-abandono. 



 O pavilhão do extinto Torino Torranense. Apesar de recente está algo degradado e em estado de semi-abandono. Com o fim do clube, entregou-se o espólio à junta de freguesia. Apesar de haver quem procure usufruir do espaço para desenvolver ali algumas actividades desportivas, a inacção, a indecisão e a falta de medidas concretas têm predominado e gerado um impasse que se mantém resta saber até quando.



 Que a memória deste infausto acontecimento e que este singelo texto inspirem os locais, já não diremos para ressuscitar o clube mas ao menos para cirar condições para que se aproveite o espaço para a prática do desporto. Esta seria sem dúvida uma forma digna de homenagear Superga, seis décadas e meio depois.



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