sábado, janeiro 25, 2014

Todos queremos a verdade



Desde a sessão da Assembleia Municipal de Alcácer do Sal, que decorreu no passado mês de Dezembro, que vamos ouvindo da boca do novo Presidente da Câmara (CDU) que haverá indícios de gestão danosa no município alcacerense por parte do anterior executivo (PS). O auge foi atingido na reunião de câmara do passado dia 9 de Janeiro e fez eco na imprensa regional. Quando confrontado pela Vereadora Isabel Vicente, agora na oposição, devido às acusações que fez na referida sessão da assembleia, Vítor Proença não só manteve o que disse como ainda afirmou que a coisa é caso de Ministério público dando ainda o exemplo maior, e a nosso ver, mais emblemático e impressionante, de fornecimentos de caixas de correio electrónico que terão custado 33 mil euros anuais aos cofres da Câmara Municipal de Alcácer quando há câmaras que pagam por esse mesmo serviço somente 25 euros… anuais (!).
Há poucos dias, foi notícia nas televisões, as buscas levadas a cabo pela Polícia Judiciária no município de Vale de Cambra, motivadas por denúncia anónima, no âmbito de uma investigação para apurar possíveis ilícitos em decisões do anterior executivo.
Ora, em Alcácer do Sal, e perante tão graves acusações, o assunto não pode nem deve morrer assim sem mais. E não deve morrer porque, em primeiro lugar, o teor das afirmações é muito grave e também não deve morrer porque o nosso edil também afirmou que os munícipes não têm consciência de tal situação. Ora acima de tudo, os munícipes exigem saber a verdade, querem ter consciência de facto; ponto final. Em segundo lugar, vem a questão política. Mas, tenhamos em conta, em política «não vale tudo» e «tem que haver ética na política»; quem o afirmou foi exactamente a mesma pessoa que acusa o anterior executivo de gestão danosa - O Sr. Presidente da Câmara Municipal de Alcácer do Sal. Presidente da Câmara esse que, perante tais afirmações, se estas não estiverem devidamente fundamentadas com factos e dados concretos que permitam sustentá-las, estará ele próprio em risco de incorrer nos crimes de difamação e denúncia caluniosa. Portanto, perante tudo isso, e por maioria de razão, não pode ser crível à partida que tal seja apenas uma manobra política do novo poder comunista com o objectivo de desacreditar e enfraquecer a oposição e arruinar a gestão socialista. Temos que partir do princípio que terá que haver algo mais. É o corolário lógico a que teremos que fatalmente chegar, partindo dessas premissas. E também já diz o povo que não há fumo sem fogo.
É portanto imperioso esclarecer e clarificar muito bem toda esta matéria e devem pôr-se desde já várias questões: Em primeiro lugar, há de facto indícios de gestão danosa na Câmara de Alcácer do Sal no período 2005-2013 com ênfase no período do segundo mandato (2009-2013)? Se sim, que actos e decisões em concreto é que configuram um caso de gestão danosa e quando e durante quanto tempo é que esses potenciais ilícitos tiveram lugar? Quais os valores concretos? Quais os casos concretos? Quem do anterior executivo cometeu consciente ou inconscientemente a alegada gestão danosa? Tudo isso deve ser tornado público não apenas por uma questão de verdade e transparência mas também por uma razão muito simples: é que não se pode nem se deve generalizar e meter todos no mesmo saco, digamos assim. Nos últimos oito anos estiveram no executivo municipal – que é um órgão colegial, isto é, formado por um determinado número de elementos e não apenas de uma única área política – várias pessoas, algumas das quais fazem parte do actual executivo, tanto na oposição como na situação - embora aqueles que estiveram na oposição entre 2009 e 2013 não tivessem pelouro atribuído e não estivessem envolvidos na gestão directa da coisa pública (o que deixou de acontecer a partir do passado mês de Outubro) ainda assim tomaram parte nas decisões das matérias levadas então a reunião de câmara.
Para além disso, e porque deve haver ética na política, a honra, seriedade, honestidade e bom nome de quem quer que seja não devem ser postos em causa nem arrastados na lama assim sem mais. Donde há que separar o trigo do joio e saber-se em concreto, quais os casos e decisões concretos que suscitam dúvida e porquê e quem concretamente do então executivo esteve directamente na origem deles sob pena de se pôr em causa, em primeiro lugar, o nome do antecessor de Vítor Proença mas também da restante vereação toda ela.
Bem faz pois Isabel Vicente – e mesmo o PS local o deve fazer – exigir que os «casos de Ministério Público» devam ser investigados e «passados a pente fino» para que os responsáveis se possam justificar – e também para «separar as águas» relembramos mais uma vez. 
Não se trata aqui neste artigo, entenda-se bem, de defender ou condenar quem quer que seja ou tão pouco entrar em questões políticas até porque nem temos conhecimento profundo deste dossier. Trata-se tão só de exigir que a verdade venha ao de cima – para nós, munícipes termos conhecimento de toda a situação seja ela qual for e consciência de facto, já agora.
Afirmou o edil alcacerense que não é homem de ameaças e que o PS pagou uma «factura política» nas anteriores eleições, dando a entender que desejaria que o caso ficasse por aqui. Lamentável se assim for pois o apuramento da verdade não pode ser confundido com manobras ou vinganças políticas. Em países desenvolvidos a «factura política» é nada por algumas razões muito simples. Em primeiro lugar porque a «factura política» não é eterna. Ninguém fica impedido de se candidatar no futuro e os derrotados de hoje podem ser os vencedores de amanhã e voltarem. Por outro lado, consta-se que aqueles que cessam funções – a nível nacional será assim? A nível local, os que exerceram funções executivas terão tal prerrogativa? E quanto, em caso afirmativo? Mais uma vez a opacidade é quem mais ordena – terão supostamente direito a um subsídio ou, como diz por aí o povo, a uma indemnização. Por fim, e mais importante, se actos e situações - e falamos em abstracto, entenda-se bem! - de âmbito criminal forem perpetradas consciente ou inconscientemente por titulares de cargos políticos e não forem colocados sob a alçada da justiça e se tudo se limitar a uma simples «factura política» isso implica automaticamente a inimputabilidade desses mesmos titulares. E é aí é que reside em grande parte a génese da crise que assola Portugal, mas também outros países da Europa (e não só) e que gera na população o descrédito da política e dos políticos, a indiganção, a revolta e afasta cada vez mais os cidadãos da democracia, enfraquecendo-a.
O drama que vivemos hoje é que qualquer um que queira ser político pode sê-lo. Repare-se que quem quiser ser médico, advogado, piloto de avião, por exemplo, não pode pura e simplesmente desejar sê-lo, candidatar-se ao lugar e pronto; tem que ter uma formação concreta e exigente para poder exercer a profissão. Os titulares do poder judicial não são eleitos e não podem simplesmente candidatar-se independentemente da sua formação. Têm que ser licenciados em Direito e posteriormente fazer uma formação específica no Centro de Estudos Judiciais para poderem ser juízes e serem titulares do órgão de soberania que são os tribunais de comarca (e não só). Já para exercer o poder legislativo ou executivo – e também autárquico – e ter na mão literalmente a chave de decisões que vão afectar directamente não apenas comunidades humanas de centenas, milhares ou milhões de cidadãos mas o próprio planeta, o próprio mundo em que vivemos, qualquer um o pode ser, mesmo até em casos extremos semi-letrados ou semi-analfabetos. Nada se lhes exige. Nem um exame para aferição de competências, habilitações e conhecimentos e já nem falamos na capacidade intelectual e na questão psicológica… nem na avaliação do carácter. Nem conhecimentos de História, nem de Cultura, nem de Gestão, nem de Ciências Naturais, nem de História e Ciência Política, nem de Gestão, nem de Direito… de nada; rien de rien. Para todos os efeitos vão-se experimentar (se der certo, fantástico; se der errado… catastrófico) e usufruir das (em alguns casos imensas) benesses inerentes ao cargo, mas também, estatuto social e poder (a vã glória de mandar) – a razão que impele a maioria desses aprendizes de feiticeiro. Desengane-se quem pensar que é o desejo de servir a razão principal de grande parte deles.
E se mesmo entre profissionais formados há aqueles que são bons e outros que são péssimos, o que não dizer daqueles, muitos deles ineptos, que fazem política; e se também há políticos bons outros há, quiçá a maioria, que são um desastre. Se a isto juntarmos a inimputabilidade dos políticos temos uma mistura explosiva que poderá detonar a qualquer instante e tendo em conta que hoje os meios de comunicação são instantâneos e variados e que hoje há mais escrutínio do que alguma vez houve, nem um presidente de uma qualquer obscura e insignificante Junta de Freguesia pode ousar sequer pensar que passará despercebido. Hoje as coisas já não são como há meia dúzia de anos em que o povo votava e pronto.
Aguardemos serenamente as cenas dos próximos capítulos.

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