sexta-feira, julho 08, 2011

Não me lixem







Desde que a Moody's decidiu classificar a república portuguesa como lixo financeiro que um coro de carpideiras se lamenta, por um lado, e um coro de indignados de ocasião vociferam em fúria contra as agências de rating, por outro. Um coro de banalidades e generalidades vagas que de pouco adiantarão. Que é injusto, que é uma afronta, que é imoral, que é... Os gregos também devem ter ficado fulos e de pouco lhes adiantou. E para completar o cenário, há ainda para aí uns movimentos nas redes sociais e umas acções apatetadas como aquela de enviar uma encomenda postal contendo lixo para a sede da Moody's, a título de exemplo. Não alinharei nisso e não me venham os idiotas patrioteiros me acusar de ser anti-patriota. Aquilo que eu ainda faço relativamente bem é pensar e mesmo sendo-se leigo numa qualquer matéria, se se tiver «dois palminhos de testa» seja em que área for depressa se conseguirá avaliar a realidade.

Vamos lá então raciocinar a frio:

O rating português tem vindo a ser sucessivamente desclassificado. A particularidade é que a última classificação jogou-o para a «segunda divisão», para o lixo. A explicação que vinha sendo dada por cá em blogs, comunicação social e afins era de natureza política e culpava o anterior governo. Porque o Primeiro Ministro não era credível, porque o governo estava totalmente desacreditado lá fora, porque ninguém acreditaria na sua palavra e na sua determinação, etc, etc. Na verdade, se Sócrates tivesse continuado, o 5 de Julho seria a machadada final, seria o dia em que Portugal veria o seu Primeiro Ministro demitir-se e iria irremediávelmente para eleições antecipadas.

Mas com Governo novinho em folha, malandras das agências de rating e veja-se de quem partem os comentários. Até Cavaco, que com Sócrates dizia que era normal, que eram os mercados a funcionar e que era preciso mudar de vida. Agora com Passos fala em desregulação do mercado e em imoralidade. Mas dali já se sabe o que a casa gasta e compreende-se o porquê da mudança de discurso.

Fala-se em guerras Dólar vs Euro, especulação, bota-abaixismo, etc. Depois, em tom triunfal, diz-se para aí que a Europa está unida e que apoia Portugal. Qual é o espanto?! Era só o que faltava se não apoiasse. Apoia Portugal, como apoia a Grécia e a Irlanda. Apoio moral, que basta para alegrar os pobres de espírito, como se isso adiantasse de muito.

Toda a gente se congratulou com as palavras do Sr. Trichet; que está do lado de Portugal e que a instituição a que ainda preside (BCE) ignorou as agências de rating e que continuou a comprar dívida portuguesa dando confiança aos mercados. E eu pergunto: Mas alguém esperava outra coisa?!
Claro que o BCE só pode fazer isso. Se, depois de conhecer a classificação da Moody's, o banco central europeu se «jogasse para trás» e abandonasse Portugal à sua sorte, seria o mesmo que dizer que os titulos de dívida pública de um seu membro (Portugal é membro do BCE) não passam de lixo financeiro tóxico. Seria o descrédito total. O BCE será a última instituição que deixará de o fazer. Para além disso, o BCE é um dos membros da «troika», juntamente com o FMI e a UE. Logo, o não apoio (político) da UE e/ou o não apoio político e, muito mais importante ainda, financeiro do BCE seria o mesmo que dizer que as medidas contidas no memorando que acordaram com Portugal não passariam elas mesmas de... lixo. É claro que o BCE só tem de continuar a comprar dívida portuguesa, lixo ou não.

Agora vejamos uma outra situação: As três agências de rating com mais quota de mercado são a Moody's, a Standard & Poor's e a Fitch, que, segundo consta, dominam 90% do mercado - quase o monopólio deste segumento. É claro que isto também é um negócio (business as all). Para fazer análises e atribuir clssificações, as agências têm que se basear numa série de critérios e recolher uma série de dados. Ora este serviço é feito por gente altamente qualificada com elevados conhecimentos técnicos e dos mercados globais que se fazem pagar principescamente e os seus clientes são grandes investidores, multinacionais, países, instituições bancárias, etc que em vez de irem ao Oráculo de Delfos (esta vem mesmo a talhe de foice) saber se ganharão ou se terão perdas avultadas vão consultar as agências de rating que, baseando-se em informação e em dados minuciosos e posteriormente tratados ao pormenor lhes fornecem informação o mais fidedigna e precisa possível e para isso pagam e não é pouco - Portugal e a sua banca inclusive pagam uns bons milhões de euros por ano a estas agências. Ora todas estas instituições financeiras só recorrem às agências de rating se estas fornecerem informação credível. Se porventura começarem a atribuir péssimas classificações a determinado investimento e depois este se revele altamente rentável e os investidores constatarem que perderam milhões porque se fiaram em dados fornecidos que lhes apontavam para não investir ou se essas atribuirem grandes classificações a um produto financeiro que se revele lixo tendo exactamente a mesma consequência para os investidores (e as perdas não são poucos trocos mas cifras da ordem dos biliões), estes no limite mandam as agências de rating às urtigas e estas começam a perder credibilidade e, mais importante, mercado. Se as três agencias de rating referidas dominam cerca de 90% do mercado é por serem altamente credíveis e por isso arrasam a concorrência que fica só com 10%.

Isto tudo para afirmar que as agências de rating não vão começar agora a dar classificações assim sem mais nem menos. Claro que há margens de erro; há sempre. Pode haver especulação, podem até querer forçar a sustentação do dólar, podem manipular mas grosso modo estes expedientes têm limites que se forem ultrapassados terão custos e consequências elevadas.

Constatei ontém, nas notícias, que a Standard and Poor's ao que parece é terrivelmente precisa a analisar a situação financeira de países, conseguindo fazer previsões que se revelam acertadas com antecedência de um ano. Esta agência irá pronunciar-se sobre Portugal no fim deste mês. Aguardo com espectativa.

Para concluir, eu repito o que já disse anteriormente: se Portugal está nesta situação só de si e dos seus bons governantes e gestores se pode queixar. Deixem-se de lamúrias e de tentar jogar areia nos olhos dos cidadãos. Quem é que eles pensam que enganam? Agora querem vir para aí uns mocitos, sabe-se lá com quem por detrás, com movimentos idiotas de pôr bandeiras à janela e mandar lixo por correio ou andar aí alegremente a mandar a Moody's à merda ou fuck you Fitch e outros a tentar alegrar a malta com declarações estemporâneas como aquela do BCE estar com Portugal e que toda a Europa está unida em torno e na defesa da pátria lusitana, que não está sozinha (eu prefiro dizer que não cairá sozinha isso sim) e que se têm que criar agências europeias de rating e blá, blá, blá, blá Whiskas saquetas? Se estamos assim aos nossos belos líderes o devemos. Deveu-se à sua incompetência, à sua incúria, à sua voracidade, à sua leviandade, à sua falta de planeamento estratégico... Fuck you Fitch??? No! Fuck you bastards!

Ora, ora; não me lixem!

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