quarta-feira, setembro 07, 2005

Inacreditável!


Tinha que acontecer mais dia, menos dia. Não! Não são nem podiam ser sempre países pobres como o Irão ou os países do sudeste asiático ou outros quaisquer a sofrer com as agruras do clima.
A Natureza, o único e supremo poder à face da Terra; verdadeira superpotência; verdadeiramente irresistível não discrimina nada nem ninguém! Autenticamente democrática e igualitária, é capaz de presentear todos os seus filhos com abundância e prosperidade mas também é capaz de os fazer sofrer terríveis privações. Não trata uns como filhos e outros como enteados e, desta vez, foi madrasta para com a pátria do Tio Sam. A Natureza foi impiedosa com os EUA e a tragedia bateu ás portas de Nova Orleães.
Katrina, um poderosíssimo furacão de grau 5 (o valor máximo da escala de medida da intensidade destes fenómenos) na rota de Nova Orleães.
Nova Orleães, cidade costeira no sul do EUA, entalada, entre o rio Mississipi e o lago Pontchartrain ; em boa parte, situada abaixo do nível do mar e do Pontchartrain. Como em qualquer local, mantida artificialmente seca recorrendo a diques. Está definida a receita para a tragédia!
Já antes os EUA tinham sido vítimas da fúria da Natureza. Já antes outros furacões de grau 5 na escala de Saffir-Simpson tinham atingido a sua costa e sismos atingido as suas cidades mas desta vez a tremenda força libertada foi suficiente para arrasar uma cidade inteira e vergar uma das nações mais poderosas do mundo actual. O Katrina pôs, literalmente, os EUA de joelhos!
Uma nação, cujos dirigentes afirmam arrogantemente, que é capaz de se bater simultaneamente em três guerras em qualquer parte do mundo; que é capaz de deslocar meios militares e combater em qualquer parte do mundo e, que gasta biliões de dólares só com o sector da Defesa, mostrou uma surpreendente fraqueza, descoordenação e incapacidade de reacção dignos de qualquer país subdesenvolvido isto quando os EUA dispõem de alta tecnologia e um dos sistemas de previsão de furacões do mais avançado que há no mundo. Os mesmos dirigentes que, ao que tudo indica, subestimaram a força da tempestade e reagiram tardiamente ao que já estava à vista de todo o mundo; os mesmos dirigentes que, com a mesma arrogância e ignorando a dimensão da destruição, se recusaram a aceitar a ajuda humanitária que de todo o mundo era oferecida... acabaram por reconhecer que a ajuda era imprescindível afirmando que os EUA iriam aceitar tudo o que lhes fosse doado!
Para além da devastação provocada (e já não é pouco!), o Katrina pôs em evidência um grande número de acontecimentos e acabar com alguns mitos que darão que pensar a muito boa gente:


1. O furacão pôs a nu as fragilidades e pontos fracos da América. Se a catástrofe atingiu apenas uma única grande cidade da gigantesca América e foi o que se viu, imagine-se o que será – infelizmente é só uma questão de tempo – quando uma catástrofe de proporções ainda maiores, como sendo uma epidemia generalizada, um tsunami como aquele que terá origem nas Canárias e que mais dia menos dia varrerá a costa leste ou a possível queda de um meteorito de dimensões consideráveis ou qualquer outro fenómeno atinja várias das maiores cidades ianques de em simultâneo. Ainda que os EUA sejam um país que procura exaustivamente saber onde falhou, e neste caso não será excepção, digerindo por muito tempo os infortúnios que lhes acontece e tente arranjar maneiras de evitar que situações dessas não se repitam no futuro, é humanamente impossível evacuar a tempo milhões de pessoas de zonas de risco eminente e, posteriormente, proceder à gigantesca tarefa de realojar os refugiados e recolher os cadáveres de pessoas que, fatalmente, não resistirão, a tempo de impedir que se transformem num foco de doenças e contaminação e impedir tudo o que de terrível vem a seguir;


2. O racismo que, para um país que se gaba de ser o campeão da liberdade, democracia e igualdade, continua a ser uma realidade. Nos últimos dias têm «chovido» acusações nesse sentido por parte de quem sustenta a tese de que a ajuda só tardou porque a capital do Jazz é uma cidade maioritariamente habitada por negros e que a situação seria distinta se a zona sinistrada fosse o Estado rico da Florida;


3. Para além das questões raciais, o Katrina vem pôr a nu as gritantes desigualdades sociais e pobreza escondidas em Nova Orleães. Ao que parece, há uma minoria rica (maioritariamente composta por brancos) que habita nas zonas altas da cidade e uma maioria pobre (principalmente composta por negros) que habita nos subúrbios e nas zonas baixas da cidade;
A tensão latente e explosiva que se vive na sociedade americana que se mantêm controlada graças a um sistema implacável e, mesmo tirânico, sistema de Justiça, que se solta nestas situações provocando o caos e a selvajaria, sendo tão real como aquilo que mostram nos seus filmes de ficção sobre grandes catástrofes provocadas pelo Homem ou pela Natureza. A cidadania e o respeito pelo próximo e pela Lei é só fogo de vista numa sociedade, que só não vê quem não quer, é doentia, boçal e pouco civilizada. Basta haver uma desagregação do sistema para a barbárie e o caos tomarem as cidades de assalto. Em Nova Orleães há relatos de saques, violações, quadrilhas que saqueiam armarias e se agrupam para assaltar tudo o que possam, matando impiedosamente quem ouse resistir. Quando a prioridade das autoridades federias é mobilizar a tropa e enviar milhares de soldados e policias para o terreno e só depois enviar equipas de socorro, estamos conversados.

Sugestão: Ler Impressões, da autoria do jornalista Luis Costa Ribas enviado da SIC a Nova Orleães em www.sic.pt

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