Bem mais púdico que Marcelo Rebelo de Sousa - que defendeu com todas as letras, sem contudo se comprometer demasiado remetendo-se a um esquivo e confortável passar de batata quente «a ponderar», o voto obrigatório - foi Miguel Sousa Távares que referiu na SIC, quando confrontado com a posição de Marcelo, que não iria tão longe, que não defenderia necessáriamente o voto obrigatório mas sim uma penalização para quem não vota (pelo menos para os abstencionistas crónicos o que não é de todo o meu caso). Ora inteligentes como ambos são, virtude que lhes reconheço, certamente já se deram conta há muito que a III República está tipo este imóvel. Desgraçada e despuduradamente no entanto Miguel Sousa Távares, cujos comentários eu particularmente aprecio, teve, neste caso, a infelicidade e a desfaçatez de passar um atestado de estupidez em directo a milhões de portugueses.
Ora então o facto de algo ser obrigatório por lei não implica que quem não cumpra não seja sancionado?! Uma não é consequência da outra ou, dito de outra maneira, algo obrigatório não é equivalente a haver penalização caso não haja cumprimento?! A conclusão, óbvia, que se tira é que tanto um como o outro disseram uma e a mesma coisa. Contudo Sousa Távares usou um cauteloso eufemismo falacioso. É que o objectivo será a eventual implementação de tal medida sem levantar muitas ondas o que demonstra claramente que a gente do sistema tem medo mas não tem vergonha.
Vejamos o exemplo destes diálogos fictícios cujo objectivo é pôr a nú o óbvio:
Diálogo 1
Dois sujeitos A e B discutindo acerca do serviço militar voltar a ser obrigatório em Portugal.
Sujeito A:
- Eu sou a favor do serviço militar vir a ser novamente obrigatório.
Sujeito B:
- Eu não defendo o serviço militar obrigatório mas defendo que quem não vá à tropa deveria ser penalizado.
Agora pergunto eu (e já agora respondo): Ora mas não era isso que sucedia antes? O serviço militar era obrigatório. Quem não fosse à tropa era penalizado! Era considerado desertor, procurado como um criminoso e preso. Ponto final.
Diálogo 2
Dois sujeitos A e B discutindo a obrigatoriedade de parar perante um sinal de STOP.
Sujeito A:
- O código da estrada diz que é obrigatório parar perante um sinal de STOP.
Sujeito B:
- Não, nada disso. Quem quiser, não pára mas depois é penalizado.
Pois; é penalizado com uma valente coima e inibição de conduzir por ter desrespeitado a obrigatoriedade de parar.
Este tipo de diálogos e de absurdos eram mais próprios destes senhores mas pelos vistos há para aí mais duplas-maravilha.
Mas quem é que eles querem enganar? Pensarão porventura que os seus concidadãos são estúpidos? Votar é um direito e um dever. Não votar é um direito. Quem não vota não cumpre o seu dever de cidadania mas também prescinde do seu direito e para mais são várias as razões que levam determinado cidadão a não votar. O Estado não pode partir do pressuposto (como estes senhores desesperada e descaradamente fizeram) de que quem não vota é simplesmente porque se está nas tintas.
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